sábado, 25 de abril de 2009

VIVA A «LIBERDADE»

CÃO: Bom dia! Óptima sombra. Viva a liberdade.
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Liberdade de quem e para quem? Demoraste muito.

CÃO: Estive a marcar todos os contentores de lixo que encontrei nas ruas desde a tua casa até aqui.
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Qual a razão?

CÃO: Não ouviste o Presidente da República dizer que temos a «liberdade» de votar «livremente» em quem quisermos?
PINCHA:
O que tem isso a ver com a tua demarcação dos contentores?

CÃO: É para dizer que são meus e que tu podes ir lá buscar alguém em quem possas votar. É um dever cívico.
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Tu achas que vou perder o meu tempo em mexer nos contentores? Para apanhar com o mau cheiro e sujar-me todo? E não ficarei só com as mãos sujas!

CÃO: O velhote da «doença» do outro dia também está muito desiludido com a situação actual. Parece-me descrente «total». Estava a apanhar sol ao portão da sua casa quando passei por ele e vi-o com uma cara tristonha.
PINCHA:
Disse-te alguma coisa?

CÃO: Perguntou-me se eu sabia do paradeiro daquele Ministro do Trabalho que «angariou», logo no 1º de Maio, o salário de um dia de cada trabalhador. Disse-me que, já em coronel, nunca mais tinha ouvido falar nele. Sabia que ele «trabalhava» muito bem em dinheiro. Até no local onde «trabalhou» alguns anos antes, quis «montar», uma sala de operações, daquelas que vimos no filme da SIC, ontem ou hoje de madrugada, no posto de Comando do MFA, com metade do dinheiro que tinham posto à sua disposição. O resto seria para «aforrar». Esse bom economista não conseguiu realizar o seu plano por burrice e casmurrice da empresa que contactou. Parece que foi uma Jomar ou coisa parecida.
PINCHA:
Isto faz-me lembrar que há gente muito esperta na nossa política, às vezes, muito bem relacionada e com óptimos parentescos: pais, tios, sobrinhos, primos e outros aderentes não faltam. É o seu suporte básico selectivo, para além do «POVO» para quem «indiscutivelmente» trabalham.

CÃO: Mas Cavaco Silva disse também que a abstenção não é solução para uma boa escolha de governo embora os políticos, nas suas propagandas eleitorais, tenham a obrigação de não apresentar propostas ilusórias com soluções fáceis mas impossíveis de cumprir.
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Para isso, já tens a minha solução conversada contigo no post de 25 de Janeiro passado.

CÃO: Mas falou também em os políticos darem o exemplo.
PINCHA:
Se for o exemplo que já deram com as «viagens», os tios, os sobrinhos, os primos, as férias, os iates de luxo e outros «mais edificantes», a minha solução de 25 de Janeiro mantém-se ao nível da Presidência da República: não vai haver abstenção. Vai haver confirmação da minha liberdade de dizer aquilo que penso.

CÃO: Pensa no que vais fazer. Senão ficaremos todos com uma mão à frente e outra atrás.
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Ficaremos não, «ficarão», queres tu dizer. Tu não tens mãos e não necessitas de manter essas «civilidades». Pelo menos podes ser sincero, com uma liberdade de expressão maior do que a minha.

CÃO: No meio deste descalabro, o pior de tudo são as organizações como a dos pobrezinhos «Coração da Cidade» que não pode dar de comer porque não tem suprimento em bens alimentares.
PINCHA:
Se não existem suprimentos podemos e devemos ajudar na medida do possível, mas na questão de voluntários, os próprios «desfavorecidos» têm a obrigação moral e cívica de se organizarem para fazer os trabalhos imprescindíveis, não onerando os outros com obrigações para além das dádivas e da comida. Aqui começa a boa democracia, a economia e o respeito pelo próximo. Não é dizer que se é pobre e ficar à espera do trabalho dos outros para receber uma esmola. Reflexo dos subsídios? Senão, estaremos como no «Violino no Telhado», uma das peças musicais que muito me comoveu quando ainda a ouvi, há mais de 20 anos, como «Fiedler on the Roof».

CÃO: Ramalho Eanes também disse que temos o país que merecemos!
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Talvez tenha razão. O que fizemos desde 1974? Esbanjar as «barras de ouro» que o «ditadorzinho das botas» acumulara durante décadas? «Meter a mão» no erário público e privado sempre que possível? Utilizar os cargos públicos para satisfazer apetites pessoais? Reivindicar «benesses», «mordomias» e bons vencimentos para as chefias? «Fabricar» bons «vira-casacas»? Conseguir «tachos» para alguns, na esfera internacional da qual nos afastamos cada vez mais no que toca ao bem-estar, nível de vida, progresso e desenvolvimento de TODA a população?

CÃO: Hoje estás impossível.
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Meu caro. Hoje seria o dia da liberdade que nunca mais chega para o povo português que, olhando para a Europa por ser europeu, ao contrário do que acontece lá fora, cria cada dia mais ricos e mais pobres, aumentando a disparidade entre os seus «rendimentos». Em Portugal, o «fosso» entre os ricos e os pobres vai aumentando e não sei onde irá parar se a Europa não nos «deitar a mão» para evitar este descalabro por mais um século. Vou dormir e descansar um pouco à sombra desta magnífica árvore que ainda continua neste parque. Quando quiserem fazer uma urbanização para os ricos teremos a liberdade de escolher outro local para «declamar as nossas mágoas».

sexta-feira, 10 de abril de 2009

OS «CUIDADOS» NUM HOSPITAL

CÃO: Até que afinal, consegui ver-te. Estava com receio!
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Demoraste muito; já me ia embora para casa.

CÃO: Nem sabes o que me aconteceu!
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Senta-te, descansa e conta-me tudo quando deixares de estar com a língua de fora.

CÃO: Estava a fazer a minha voltinha do costume, quando numa casa donde tinha desaparecido m cão muito grande há já algum tempo e eu demarcava a minha área, vi um senhor ao portão. Fiquei sem saber se deveria ou não «marcar» o local, mas não me atrevi a fazê-lo com o senhor naquele sítio. Quando passei por ele e olhei para o seu semblante triste, ele afagou-me a cabeça e eu não fugi. Gostei. Enquanto fiquei ao pé dele, a olhar para o seu ar de tristeza, parece que ele ficou com vontade de falar. Ou desabafar?
PINCHA:
O que é que ele te disse?

CÃO: Disse-me que estava lá porque já não tinha a única companhia do cão que lhe tinham oferecido logo depois de ter enviuvado, recentemente. O cão morrera com uma doença súbita e ele já não tinha a sua companhia. Vinha ao portão «apanhar ar» e ver as pessoas. Disse-me que eu não tinha de «marcar a propriedade» porque podia considerá-la sua. O seu canzarrão já tinha «partido» para bem longe deixando-o só. A mulher também. Faltava só ele.
PINCHA:
Bem triste, mas realista.

CÃO: O que mais me impressionou, ao dizer-me isso, foi o seu ar muito tristonho e quase fatalista. Fiquei a olhar para ele, muito intrigado.
PINCHA: E ele disse-te mais alguma coisa?

CÃO: Sim. Como já tem bastante idade, com problemas de circulação sanguínea e de digestão, ao ver bastantes fezes negras e a sentir-se muito fraco, resolveu chamar a ambulância e ir para a urgência do hospital porque 15 anos antes tivera problemas com uma úlcera a sangrar, exigindo transfusão sanguínea urgente. Não desejava a repetição da situação.
PINCHA:
Um bocado aborrecido e assustador!

CÃO: Mas o pior é que depois de estar uma noite na urgência, foi transferido para um hospital onde o medicaram e lhe fizeram uma endoscopia que concluiu não existir qualquer úlcera mas sim uma hérnia no estômago. A partir do dia seguinte e sem fezes negras durante um dia, teve um fim-de-semana de descanso, fora do hospital, com medicação controlada pelo médico assistente e sem qualquer dieta especial.
PINCHA:
Ainda bem.

CÃO: Mas ele tomava medicamentos para os seus males de coração e circulação sanguínea que foram interrompidos e, no momento, durante o fim-de-semana, tinha de lidar com medicamentos com nomes completamente diferentes. Por isso, ele baralhou tudo, exagerou na dose e foi «de charola» para uma urgência porque se sentiu mal, vomitou sangue e desmaiou.
PINCHA:
Estás a deixar-me preocupado.

CÃO: Teve de levar uma transfusão de sangue e ficar de dieta rigorosa até fazer uma nova endoscopia e ver as fezes «normais». A nova endoscopia apresentou duas úlceras e a «famosa» hérnia. E ele perguntou-me: “Com esta diferença de «visualização», as hérnias estariam a jogar às escondidas? Ou o «especialista» estaria «cegueta»? Ou seria qualquer outra coisa que não convém dizer?
PINCHA:
Eu diria «qualquer outra coisa» por causa da pressa com que se «fabricam» os médicos e os especialistas. E ele não reclamou e ficou satisfeito?

CÃO: O que te posso dizer é que isso lhe custou mais uns dias que não foram agradáveis, porque num hospital em que se exige silêncio, o pessoal auxiliar não fazia outra coisa senão falar alto, discutir, quase «dar ordens» como, por exemplo, “saia da cama porque tenho de fazer a cama”, embora acrescentasse a essa linguagem com tom de ordem, as palavras «querido», «amor» ou qualquer outra equivalente. Este senhor também ficou «baralhado» porque sempre tratou todos os profissionais por «senhor» ou «senhora» e eles sempre o trataram, como a todos, por «você».
PINCHA:
Também não compreendo a diferença de tratamento de uns por «senhor» enquanto os outros o tratam por «você». Parece que estamos na «tropa».

CÃO: Será muito difícil tratar todos por «senhor/a»? De facto, vocês têm uns preconceitos «tão fabricados» pelo género humano! São todos iguais, mas todos diferentes, cada vez mais, à medida que sobra o dinheiro, a influência, o poder ou a indigência. Mas, o pior de tudo é que ele ficou com inchaços no braço para colocar as «sondas» de soro e de sangue. Ele diz que um enfermeiro alto, magro, de óculos, «bem falante» e com ar de convencido, tanto «escarafunchou» no seu braço que só colocou a agulha à terceira tentativa. Além disso, queria que o «doente» soubesse qual o seu grupo sanguíneo quando no dia anterior já lhe tinham sido feitas as análises e sabiam o grupo. Por isso, tirou o sangue por duas vezes «porque tinha havido uma falha técnica». Este homem, além de maltratado, ficou mais aflito ainda no dia seguinte quando soube que esse enfermeiro tinha enviado, para análise, duas ampolas de sangue sem o rótulo ou a etiqueta do «dono». Não teria acontecido o mesmo com ele próprio no dia anterior assim como com outros em situações idênticas?
PINCHA:
Pois é. Não seria melhor que os médicos, os enfermeiros e os outros profissionais pugnassem mais pela sua competência em vez de o fazerem só por vencimentos e promoções? As avaliações são importantes para todos, sejam eles especialistas, dirigentes, políticos ou gestores. Todos deveriam ser avaliados antes de «receber os bónus» e até os vencimentos que alguns mal merecem! E disse mais alguma coisa?

CÃO: Sim. Que além da «barulheira» a começar logo de manhã e do tratamento social «senhor» «você», os médicos e os enfermeiros deveriam ter mais atenção para com os doentes «conversando» com eles para lhes reduzir as dúvidas, dar esclarecimentos ou ajudar a preparar um plano de prevenção para evitar, pelo menos, futuros males semelhantes aos do momento. Não deveria ser necessário tirar a «saca-rolhas» as informações necessárias. Este doente não as teve no seu internamento anterior e isso levou-o a um segundo surto de «urgência» que poderia ter sido muito mais grave, já que não tinha em casa quem o ajudasse e cuidasse dele.
PINCHA:
É bom que, especialmente os médicos pensem nisso, já que estão no topo da hierarquia e, geralmente, dão os exemplos que os outros seguem.

CÃO: Já viste as «desgraças» a que todos nos sujeitamos?
PINCHA:
Tens razão. Pelo menos com a experiência que vamos tendo, é necessário reivindicar mais condições sociais do que só financeiras. Por agora, estás desculpado da demora de hoje e, daqui em diante, já sei onde te encontrar. Pode ser que qualquer dia até eu vá falar com o homem para saber mais «novidades» já que tu deves passar por lá muitas vezes.